sexta-feira, 28 de janeiro de 2011

NA FIBRA AGIA




















Meu corpo sustenta a pedra, que desconhece seu destino, a carga dura de mil anos.
Como pode suportar meu peso, a caminho da morte, essa civilização sólida? 
Eu, dor pungente que sou sob seus pés, sem antibióticos infecto a memória original enquanto agonizo, meu fóssil causa-lhe vaga impressão.
Nós que nunca nos olhamos, frente a frente, pois jamais merecemos essa franqueza, o tempo, não demora teremos na boca o gosto apodrecido do limo.
E os homens usarão aspiradores barulhentos, nos músculos exauridos, nas articulações desligadas do mundo e por todos os nossos restos, sem decifrar pegadas.
Quem há de evocar meus dias anônimos arrastando o minério sobre os ombros, se escavações ou pesquisas, não descobrem almas?
A dor costura a mortalha, lentamente, com agulhas rombudas, na carne.
É que o espírito é um demônio em flagelo e de seus gritos surgem mazelas que tatuam os corpos e mais, a saliva ácida é a moldura carcerária.
A pedra, em toda perfeição de seu excesso, me tem por fardo e eu temo aliviar dores, nossas fibras, com pílulas soníferas, antes melhor seria cometer um crime.
A pedra, eu digo: Sou pedra e medo! Portanto, se num momento cotidiano qualquer eu desistir, não me ouça. Saiba que apenas adormeci.
Pesa-me o calhau que me carrega nos dias, embora, nossas faces metamórficas sejam gêmeas.

AUTOR: IRA BUSCACIO


FONTE: FACES DO POETA

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